CANTIGA DA MOÇA DO AMOR AMARRADO
Eu sou
só mais uma.
Mas,
eu sinto. Penso.
Tenho
nervos. Sofro.
Impossível
adormecer no colo de uma esperança,
de
uma perspectiva,
de
uma lenda,
porque
eu tenho fome. Sofro.
Tenho
muitos amigos.
Tenho
muitos irmãos.
Tenho
muito sol pela frente,
e
muita chuva dorme comigo,
num
passado de bonecas, passeios
e
papeis rasgados.
Eu
sou.
Eu
sinto.
E
existe uma lua que não tem sentido,
envolvendo
cada passo que dou,
cada
dia que vivo.
Memórias
de amados me cercam,
como
a cerca cerca o verde do pântano.
Como
quem pega e larga alguma coisa,
eu
me entrego e me tranco.
Insisto
e desisto,
com
voracidade e desânimo.
Em
mim, a expectativa:
vai
aparecer alguém ― eu sei.
Enquanto
isso, o vazio.
E
eu me deito com a solidão,
com
a mesma coragem
com
que o trem rasga a madrugada.
Me
perdoe, você, que se apaixonou por mim:
meu
coração é cigano,
não esquenta lugar.
São Paulo 1973