VENEZA. VÊNUS. VERÃO

E todos os gondoleiros louros
atravessaram os canais, os faróis e os umbrais
das poesias mais tempestuosas,
das saudades mais amargas,
das promessas vagas, lancinantes mágoas,
procurando a luz em lâminas de alento.

Trazem de um além,
de alucinantes águas,
todos os interlúdios, luas e alaúdes,
barquejando, ao léu, em lânguidos enleios,
em volúpias, lágrimas e alumbramento.

Glândula das lágrimas.
Gôndola das lástimas.
Assemelham-se no som, no sem, no só e na beleza.

Veneza embarca e emborca
as inúteis serenatas
e as dores embalsamadas
em acalantos e madrigais,
madrugadas e fracassos.

Gondoleiros loucos.
Bandoleiros louros.
Coração na mão, em vez de astrolábios.
Ao amanhecer,
já se esqueceram dos insucessos da noite,
e mal se esvanece o dia nos incêndios do crepúsculo,
uma vez mais gondolejam pelos túneis do infortúnio,
dos malogros e naufrágios.

São noites de muito inverno. De verão. De tarantelas.
São noites de primavera desperdiçadas na espera
de quem espera esperança
e sem esperança espera.

Varginha 1971


© 2022 Marcos Resende
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