E todos os gondoleiros louros
atravessaram os canais, os faróis e
os umbrais
das poesias mais tempestuosas,
das saudades mais amargas,
das promessas vagas, lancinantes
mágoas,
procurando a luz em lâminas de alento.
Trazem de um além,
de alucinantes águas,
todos os interlúdios, luas e alaúdes,
barquejando, ao léu, em lânguidos
enleios,
em volúpias, lágrimas e alumbramento.
Glândula das lágrimas.
Gôndola das lástimas.
Assemelham-se no som, no sem, no só e
na beleza.
Veneza embarca e emborca
as inúteis serenatas
e as dores embalsamadas
em acalantos e madrigais,
madrugadas e fracassos.
Gondoleiros loucos.
Bandoleiros louros.
Coração na mão, em vez de astrolábios.
Ao amanhecer,
já se esqueceram dos insucessos da
noite,
e mal se esvanece o dia nos incêndios
do crepúsculo,
uma vez mais gondolejam pelos túneis do
infortúnio,
dos malogros e naufrágios.
São noites de muito inverno. De verão.
De tarantelas.
São noites de primavera desperdiçadas
na espera
de quem espera esperança
e sem esperança espera.
Varginha 1971